quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Já Nascemos Com Sono


Os seres humanos adquirem a capacidade de bocejar ainda na barriga da mãe, indica um estudo publicado na revista científica de acesso livre "PLoS ONE".
A descoberta, feita por pesquisadores da Universidade de Durham e da Universidade de Lancaster, ambas no Reino Unido, foi feita usando a tecnologia 4D, um tipo de ultrassom que permite ver detalhes tridimensionais dos fetos em tempo real.

A equipe de Nadja Reissland viu os bocejos, caracterizados pelo longo tempo de abertura da boca, em 15 fetos, da 24ª à 36ª semana de gestação.


Embora algumas pesquisas sugerem que fetos  bocejem, outros discordam argumentando que é a abertura da boca simples. Além disso não há nenhuma tabela de desenvolvimento do feto bocejando comparando com abertura de boca simples. O objetivo do presente estudo foi estabelecer um projeto de medidas repetidas no desenvolvimento fetal de bocejar em comparação com a abertura da boca simples. O artigo completo pode ser acessado em:  Development of Fetal Yawn Compared with Non-Yawn Mouth Openings from 24–36 Weeks Gestation

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Expansão urbana ocorre de acordo com demandas do mercado




Giovanni Santa Rosa, especial para a Agência USP de Notícias

A expansão urbana — ou seja, a transformação em área urbana de terrenos definidos legalmente como rurais — não é controlada, nem sequer planejada por parte considerável dos municípios, aponta pesquisa da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP. As cidades aumentam seus perímetros urbanos casuisticamente ou criam, sem regulamentação federal, figuras jurídicas para contemplar estruturas como condomínios fechados, ranchos ou sítios, novas tipologias do mercado para famílias de rendas médias e altas. De acordo com a arquiteta Paula Santoro, autora do trabalho, essa expansão é caracterizada por uma normatização on demand, definida a partir das demandas do mercado imobiliário e da correlação de forças com o setor agrícola.

A  tese de doutorado Planejara expansão urbana: dilemas e perspectivas foi orientada pelo professor Nabil Georges Bonduki, da FAU.  Segundo a  pesquisa, a expansão ocorre sem planejamento ou  controle  porque os municípios compõem com o mercado imobiliário em torno de uma ideia comum: “crescer em expansão urbana é desenvolver-se”. De 100 municípios paulistas cujos dispositivos legais e figuras jurídicas foram estudados pela pesquisadora, 28 possuem leis municipais voltadas para loteamentos fechados sem que haja uma regulamentação federal. Isso sem falar nos que possuem a tipologia, sem reconhecê-la através de normas. A arquiteta critica a conivência com tal tipo de empreendimento. “As áreas verdes ficam ilhadas entre muros. Não há mais espaços públicos, de encontro, de cidadania”, afirma Paula.

Um dos três estudos de caso realizados mostra esta coalizão social em torno dos benefícios da urbanização: as elites se articulam com os políticos e com a mídia, e tentam estruturar e vender para a cidade a ideia de que crescer é bom, para obter lucros a partir do processo de urbanização. No entanto, a cidade encontra seu limite nas terras voltadas à produção de cana-de-acúcar. Esse produto agrícola demanda terras próximas à usina, para diminuir custos com transporte. Mesmo tendo um valor menor que o urbano, essas áreas são mantidas pelos produtores rurais pela importância que têm para seus negócios.

Tentativas de Controle


Há casos em que o município trabalha para tentar controlar a expansão. Em São Carlos (SP), há uma cobrança que incide na transformação da área rural em urbana. O objetivo é recuperar parte da valorização que o proprietário obtém na mudança e que deveria ir para a coletividade, uma vez que poder expandir foi uma decisão pública e não pode beneficiar poucos.
Já em Bogotá, capital da Colômbia, que foi estudada como uma das referências internacionais, a expansão urbana é fortemente planejada, como forma de que a infraestrutura urbana acompanhe o crescimento da cidade. Mesmo assim, a lógica do mercado ainda permanece e dificulta a obtenção de um bom resultado urbanístico. Há uma forte concentração de pobres em uma região e os ricos isolam-se em outra, bem distante da primeira.

Fases da expansão


Segundo a pesquisadora, a expansão urbana brasileira pode ser dividida em três grandes momentos. O primeiro, entre as décadas de 1930 e 1950, se dá no contexto da industrialização como política econômica e se caracteriza pela ausência de controle sobre o crescimento das cidades, como forma de criar um exército de reserva de mão-de-obra para baratear custos e facilitar a expansão industrial.
O segundo momento, compreendido no período da ditadura civil-militar (1964-1985), tem como principal traço o descompasso entre a produção de casas e a produção da cidade: ao mesmo tempo em que as políticas habitacionais recebem muito investimento por intermédio do Banco Nacional da Habitação (BNH), a infraestrutura urbana não recebe a mesma atenção. Também surgem diversas leis para tratar da expansão urbana.
O terceiro momento, que vai da redemocratização até os dias de hoje, se define pela criação de novas regulações e instituições, como o Estatuto da Cidade, mas delega a maior responsabilidade sobre o tema aos municípios. É nesse contexto que ocorre a flexibilização do parcelamento do solo, que permite que municípios definam como urbana áreas sem equipamentos urbanos mínimos e estes terminam por criar figuras jurídicas que se contrapõem a normas federais.
O trabalho foi realizado como parte do projeto de pesquisa “Urbanização e preço da terra em franjas de municípios do Estado de São Paulo”, desenvolvido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Paula destaca a importância da pesquisa para as políticas públicas, pois traz uma reflexão sobre formas de planejar a expansão urbana, que pode ser feita junto com os municípios, aproximando o pesquisador das questões mais cotidianas de uma Prefeitura.
A arquiteta ainda critica programas como o Minha Casa Minha Vida, no que tange o tema da expansão urbana. Segundo ela, o programa deixa para os municípios a questão do planejamento urbano, mas eles não têm força para direcionar onde querem os empreendimentos garantindo a produção de cidades e não apenas de casa, em lugares já urbanizados e infraestruturados. “Estamos repetindo a política do BNH, construindo casas na periferia, longe da cidade, com mais recursos e mais flexibilização das normas urbanísticas”, conclui. “A terra, no Brasil, nunca foi encarada com um elemento estruturante.”

Células-tronco embrionárias serão testadas em tratamento de retina


Por Karina Toledo
Agência FAPESP – Uma terapia baseada em células-tronco embrionárias para degeneração macular relacionada à idade (DMRI) – principal causa de cegueira entre idosos – começará a ser testada em humanos no início de 2013. O anúncio foi feito pelo cientista britânico Pete Coffey, da University College London, durante o 7º Congresso Brasileiro de Células-Tronco e Terapia Celular, realizado em São Paulo em outubro com apoio da FAPESP. A pesquisa britânica está sendo conduzida no âmbito do London Project to Cure Blindness, uma parceria entre Coffey e o cirurgião Lyndon da Cruz, do Hospital Moorfields Eye, de Londres. A técnica, que consiste em aplicar na região afetada da retina uma espécie de curativo contendo células-tronco embrionárias já diferenciadas em células da retina, foi testada com sucesso em ratos, camundongos e porcos. “Agora, vamos testá-la em dez pacientes. Um grupo pequeno e bem específico no início, pois o objetivo é avaliar a segurança do tratamento”, disse Coffey à Agência FAPESP.

Segundo o pesquisador, a DMRI acomete a região central da retina, conhecida como mácula, onde há grande concentração de fotorreceptores responsáveis pela visão de cores e detalhes. Abaixo dessa camada de fotorreceptores, existe o epitélio pigmentado e, ainda mais abaixo, a membrana de Bruch. Com o envelhecimento, nos indivíduos predispostos restos celulares começam a formar cristais no fundo do olho conhecidos como drusas, que destroem os fotorreceptores e provocam proliferação anormal de vasos sanguíneos sob a retina. Isso afeta a integridade da mácula e compromete a visão central e a capacidade de distinguir cores. A doença é comum em pacientes com mais de 55 anos e chega a atingir mais de 25% das pessoas acima de 75 anos. Cerca de 90% dos casos correspondem à forma seca da doença, de evolução lenta e ainda sem tratamento. Os demais pacientes apresentam a forma úmida, bem mais agressiva e caracterizada por hemorragias que comprometem o tecido da retina. O tratamento atual consiste em aplicação de lasers ou injeção de drogas que inibem a formação de novos vasos sanguíneos na região. “Nos casos mais graves, a camada intermediária da retina (epitélio pigmentado) se rompe levando à perda de visão nesse ponto. Esses casos são os que pretendemos tratar”, disse Coffey. Inicialmente, a equipe do projeto inglês desenvolveu uma técnica cirúrgica que consistia em retirar células saudáveis do epitélio pigmentado do próprio paciente e transplantá-las para a região afetada. “Tivemos bons resultados, mas a cirurgia é demorada, pode durar até três horas, o que aumenta muito os riscos”, disse Coffey. Para diminuir o tempo e o risco da operação – e poder beneficiar pacientes com estágios menos avançados da doença –, os cientistas tiveram a ideia de aplicar na camada intermediária da retina uma membrana previamente preparada em laboratório contendo células de epitélio pigmentado obtidas a partir de células-tronco embrionárias humanas. “Nos testes em animais não registramos formação de tumores, pois o processo de diferenciação celular ocorre em laboratório. Se a terapia também se mostrar segura em humanos e se conseguirmos manter uma boa visão em três ou quatro dos dez primeiros pacientes, os testes clínicos serão considerados bem-sucedidos”, disse Coffey. 

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Proteína de planta nativa tem atividade antitumoral


Pesquisadores do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) estão desenvolvendo estudos com a pulchellina, uma proteína extraída das sementes da Abrus pulchellus, espécie de trepadeira nativa no País, encontrada no nordeste brasileiro e também na África. Os estudos in vitro mostraram que a pulchellina apresenta uma atividade tóxica celular, interferindo na síntese de proteínas. Outra particularidade é que ela leva à apoptose, que é a morte celular programada.
Essas características fazem dela uma candidata ao desenvolvimento, no futuro, de fármacos dirigidos ao tratamento de tumores, principalmente os superficiais (de pele). Os estudos estão sendo conduzidos pelo Grupo de Biofísica Molecular “Sérgio Mascarenhas”, do IFSC, sob a coordenação da professora Ana Paula Ulian de Araújo, com participação da professora Leila Maria Beltramini, do IFSC, além de outros três pesquisadores, técnicos e alunos de pós-graduação.

A pulchellina é considerada uma proteína inativadora de ribossomos (locais de síntese de proteínas dentro das células) do tipo 2 (RIP tipo 2). “A ricina, encontrada na mamona, e a abrina, encontrada na Abrus precatorius, pertencem à mesma família e podem ser consideradas como outros exemplos mais conhecidos dessa família de RIPs tipo 2”, conta a professora Ana Paula.

A pesquisadora explica que os primeiros estudos começaram a ser realizados há cerca de dez anos, quando o pesquisador Renato de Azevedo Moreira, da Universidade Federal do Ceará, forneceu algumas sementes da planta para pesquisa.

Ao longo deste tempo, foi possível realizar alguns estudos básicos sobre a pulchellina, como os de caracterização da citotoxicidade da proteína, bem como o isolamento e a identificação de isoformas. “Identificamos quatro isoformas mais viáveis para aplicação em pesquisas, sendo que algumas são mais tóxicas que outras”, diz a professora.



Moléculas recombinantes

A molécula da pulchellina apresenta duas partes. Uma é responsável pelas atividades de toxicidade. A outra, responde pelo mecanismo que permite a sua entrada dentro das células. “Estamos trabalhando tanto com a proteína nativa, extraída e purificada diretamente da planta, como também com as duas partes isoladamente, obtidas por meio de engenharia genética”, explica. “Neste processo, o gene da planta foi isolado e introduzido em uma bactéria para esta célula produzir as partes da proteína em um meio de cultura apropriado. Estas novas moléculas são chamadas de recombinantes”, conta.
Atualmente, os pesquisadores contam com a parceria de uma empresa de biotecnologia de Campinas, onde estão sendo realizados estudos in vitro e em animais com o objetivo de desenvolver uma formulação que permita a entrada da cadeia tóxica da pulchellina dentro da célula tumoral sem afetar as demais. “A ideia é que uma vez desenvolvida a nanoestrutura e a formulação, a toxina poderá ser utilizada sobre tumores localizados superficialmente”, diz a professora.
O projeto para aplicação biotecnológica da pulchellina está em andamento e encontra-se em fase de avaliação da eficácia do sistema tanto in vitro como in vivo. A pesquisa tem apoio do Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas (RHAE) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).


segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Mecanismo de defesa antioxidante de bactérias é desvendado


Por Karina Toledo
Agência FAPESP – Quando bactérias patogênicas invadem o corpo humano ou de outros mamíferos, as células hospedeiras liberam substâncias tóxicas para tentar se livrar da presença indesejada. Uma nova pesquisa, feita na Universidade de São Paulo (USP), desvendou um dos mecanismos pelos quais certos tipos de bactérias se defendem desse ataque. Os resultados, publicados este mês na PLoS One, abrem caminho para a descoberta de moléculas capazes de inibir o sistema de defesa bacteriano e dificultar o avanço da infecção. A pesquisa, apoiada pela FAPESP, foi feita com a Chromobacterium violaceum, microrganismo que afeta principalmente o fígado e a pele de indivíduos com o sistema imunológico comprometido. “A C. violaceum é uma bactéria oportunista. Pretendemos explorá-la como modelo para estudar patogenicidade porque ela já teve seu genoma sequenciado e é relativamente fácil manipulá-la geneticamente”, explicou Luis Eduardo Soares Netto, supervisor do estudo de pós-doutorado de José Freire da Silva Neto, que deu origem ao artigo.
Os cientistas investigaram o mecanismo de produção de uma enzima usada pela bactéria para decompor o peróxido orgânico, substância oxidante liberada pelas células hospedeiras após a invasão. “O peróxido orgânico causa estresse oxidativo na bactéria, o que dificulta sua reprodução e pode levá-la à morte. Para se defender, o patógeno produz uma enzima antioxidante chamada Ohr. A produção dessa enzima, por sua vez, é regulada por outra proteína – que atua como fator de transcrição – chamada OhrR”, contou Netto.
Quando a bactéria está em condição basal, a proteína OhrR fica ligada ao gene responsável pela produção da enzima Ohr. “Dessa forma, impede que o DNA seja transcrito em RNA e que a enzima seja produzida”, disse. Mas, ao entrar em contato com o peróxido orgânico, a OhrR se oxida e se desliga do DNA, permitindo a produção da enzima antioxidante. “Depois que a Ohr cumpre seu papel de decompor o peróxido orgânico, outra enzima chamada tiorredoxina entra em ação para fazer com que o fator de transcrição OhrR se ligue novamente ao gene e iniba a produção de Ohr”, explicou Netto. Esse mecanismo de defesa também está presente em outros gêneros de bactérias, como Streptococcus e Pseudomonas – ambos causadores de doenças respiratórias, infecções cutâneas e sepse em humanos. Também está presente em fitopatógenos como a Xylella fastidiosa, que causa nas laranjeiras a doença clorose variegada de citros, popularmente conhecida como praga do amarelinho.
Driblando a defesa
“Agora que sabemos como a bactéria se defende, podemos pensar em meios para driblar esse mecanismo. Uma possibilidade seria inibir a produção da enzima Ohr. Outra seria ativar a produção de OhrR, para anular o sistema antioxidante”, disse Netto. O primeiro passo, segundo o pesquisador, seria demonstrar experimentalmente em camundongos que essas manobras genéticas realmente tornariam mais fácil para o organismo hospedeiro combater a bactéria.
Os testes ainda estão sendo padronizados, mas a ideia é silenciar os genes da Ohr e da OhrR na C. violaceum e avaliar se isso altera sua capacidade de infectar os animais. “Como não existem homólogos da Ohr e da OhrR em mamíferos ou plantas, se conseguirmos desenhar uma molécula que atue sobre essas proteínas, ela teoricamente teria ação específica sobre a bactéria, sem efeito colateral para o hospedeiro”, afirmou Netto.
Embora ainda em fase preliminar, os estudos abrem caminho para o desenvolvimento de novos medicamentos. “Hoje já se sabe que muitos antibióticos têm como mecanismo de ação a geração de estresse oxidativo nas bactérias. Essa questão está ganhando força”, disse. O estudo de pós-doutorado está vinculado ao Projeto Temático “Aspectos biológicos de tióis: estrutura proteica, defesa antioxidante, sinalização e estados redox” , coordenado por Netto. Também está ligado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Processos Redox em Biomedicina (Redoxoma). 

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Licopeno diminui o risco de derrame em homens

Resumo dos autores: Objetivo: O consumo de frutas e vegetais e os níveis de carotenóides séricos têm sido associados com diminuição do risco de acidente vascular cerebral, mas os resultados têm sido inconsistentes. O objetivo do presente estudo foi examinar se as concentrações séricas de carotenóides importantes, [alfa]-tocoferol e retinol, estão relacionados com qualquer traço AVC isquêmico e nos homens.
Métodos: A população de estudo consistiu de 1.031 homens finlandeses com idades entre 46-65 anos, na doença cardíaca isquémica Kuopio coorte fator de risco. As concentrações séricas de carotenóides e retinol [alfa]-tocoferol foram medidos por cromatografia de alta performance de líquido. A associação entre as concentrações séricas de licopeno [alfa]-caroteno, [beta]-caroteno, [alfa]-tocoferol, e retinol e o risco de acidentes vasculares cerebrais foram estudados, utilizando modelos de riscos proporcionais de Cox.

Resultados: Um total de 67 cursos ocorreu, e 50 destes foram acidentes isquêmicos cerebrais durante uma média de 12,1 anos de acompanhamento. Após o ajuste para idade, anos de exame, IMC, pressão arterial sistólica, tabagismo, níveis séricos de lipoproteína de baixa densidade colesterol, diabetes e histórico de derrame, os homens no quartil mais alto de concentrações séricas de licopeno tiveram 59% e 55% menores riscos de acidente vascular cerebral isquêmico e qualquer acidente vascular cerebral, em comparação com os homens no quartil mais baixo (hazard ratio [HR] = 0,45, intervalo de confiança de 95% [IC] 0,25-0,95, p = 0,036 para qualquer curso e HR = 0,41, 95% CI 0,17-0,97, p = 0,042 para AVC isquêmico). [Alfa]-Caroteno, [beta]-caroteno, [alfa]-tocoferol, retinol e não estiveram relacionados com o risco de acidentes vasculares cerebrais.

Conclusões: Este estudo prospectivo mostra que altas concentrações séricas de licopeno, como um marcador de consumo de tomates e produtos à base de tomate, diminuir o risco de acidente vascular cerebral qualquer curso e isquêmica em homens.

Artigo disponível para assinantes em: Serum lycopene decreases the risk of stroke in men: A population-based follow-up study Karppi, Jouni PhD; Laukkanen, Jari A. MD, PhD; Sivenius, Juhani MD, PhD; Ronkainen, Kimmo MSc; Kurl, Sudhir MD

GLOSSÁRIO: 
IMC: índice de massa corporal
IC: intervalo de confiança 
FINMONICA: parte finlandesa de Monitoramento das Tendências e Determinantes em Doenças Cardiovasculares 
HPLC: maior cromatografia líquida
HR: taxa de risco 
CID-9: Classificação Internacional de Doenças, revisão 9 
KIHD: Kuopio isquémica cardíaca Fator de Risco de Doenças 
LDL: lipoproteína de baixa densidade 
ROS: espécies reativas de oxigênio 
PAS: pressão arterial sistólica

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Molécula protege neurônios em condições de isquemia


Por Karina Toledo
Agência FAPESP – Em artigo publicado na revista PLoS One, um grupo de pesquisadores do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP) demonstrou que a bradicinina – peptídeo com conhecida ação anti-hipertensiva – é capaz de reverter o processo de morte celular em condições que ocorrem durante uma isquemia cerebral. A pesquisa foi feita em colaboração com cientistas de Porto Rico.
“Quando há oclusão das artérias e o fluxo de oxigênio é interrompido, as células morrem e liberam uma substância chamada glutamato. Isso estimula os receptores de glutamato, inclusive aqueles do tipo NMDA (N-metil D-Aspartato) em células vizinhas, permitindo a entrada de cálcio na célula de forma descontrolada”, explicou Alexander Henning Ulrich, coordenador do Projeto Temático apoiado pela FAPESP.
Quando esse excesso de cálcio atinge a mitocôndria, estimula a formação de espécies reativas de oxigênio e induz programas de apoptose, uma espécie de suicídio celular.
“Em experimento feito com ratos, a bradicinina conseguiu reverter o processo de apoptose. Isolamos cortes de uma região do cérebro desses animais, o hipocampo, e colocamos em uma solução fisiológica. Em seguida, fizemos uma estimulação elétrica com eletrodos e medimos a atividade neuronal”, disse Ulrich.
Para simular o que ocorre no cérebro após uma isquemia, os pesquisadores trataram o tecido com NMDA, causando uma invasão de cálcio nas células. A medição da atividade neuronal feita em seguida mostrou que 80% dos neurônios piramidais do hipocampo haviam iniciado o processo de apoptose. Mas, quando o tecido cerebral recebeu bradicinina após a exposição ao NMDA, a maioria das células foi resgatada da morte.
“Ainda estamos investigando qual é exatamente o mecanismo que confere à bradicinina esse efeito neuroprotetor. Nossa hipótese é que ocorre a ativação de uma sinalização que interrompe o processo de apoptose”, disse Ulrich.
Apesar dos resultados promissores, de acordo com o pesquisador é pouco provável que a bradicinina possa ser usada para tratar isquemia cerebral. Alguns estudos indicam que subprodutos resultantes da degradação da molécula, tais como a des-arg9-bradicinina, poderiam induzir efeitos adversos, agravando os danos causados pela isquemia.
“Nosso objetivo é descobrir uma substância análoga à bradicinina que tenha o efeito neuroprotetor sem as reações indesejadas”, disse.
Versátil
A bradicinina foi isolada há mais de 50 anos por pesquisadores brasileiros. Eles observaram que o veneno da cobra jararaca-da-mata (Bothrops jararaca) aumentava a presença desse peptídeo no sangue de mamíferos.
As substâncias responsáveis pelo aumento da concentração da bradicinina – denominadas peptídeos potencializadores da bradicinina (BPPs) – serviram de base para o desenvolvimento do captopril e de toda uma classe de medicamentos anti-hipertensivos.
No Temático coordenado por Ulrich, o objetivo é descobrir novos usos para a molécula. A equipe verificou em modelos celulares in vitro que a substância estimula a neurogênese, ou seja, faz com que células-tronco do cérebro se transformem em novos neurônios. A descoberta abre caminho para novos tratamentos para doenças degenerativas, como Alzheimer e Parkinson.
Em outro experimento feito com ratos modelos da doença de Parkinson, Ulrich e a pesquisadora Telma Tiemi Schwindt Diniz Gomes, professora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, conseguiram reverter quadros semelhantes aos que ocorrem em pacientes com Parkinson em estágio avançado.
Os resultados foram apresentados durante a 27ª Reunião Anual da Federação de Sociedades de Biologia Experimental (FeSBE), realizada em Águas de Lindoia no mês de agosto.
“Induzimos a morte dos neurônios dopaminérgicos em um dos hemisférios dos animais e eles passaram a apresentar falhas motoras, observadas como comportamento rotacional após a indução do sistema dopaminérgico por apomorfina”, contou Ulrich.
“Cinquenta e seis dias após a administração da bradicinina, o comprometimento da função motora foi revertido na maioria dos animais. A análise histológica sugere que, de fato, a melhora foi causada pela neurogênese induzida pela droga”, afirmou.
Leia mais sobre os efeitos da bradicinina sobre a neurogênese em reportagem na revistaPesquisa FAPESP 

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Desacoplamento de neurônios pode ser estratégia de neuroproteção


Por Fábio de Castro
Agência FAPESP – Além das conhecidas sinapses químicas – que permitem a interação entre as células nervosas, envolvendo neurotransmissores e receptores –, os neurônios também se comunicam com sinapses elétricas. Nesse tipo de sinapse, correntes de íons passam diretamente de uma célula a outra por meio de canais conhecidos como “junções comunicantes”, produzindo um acoplamento entre os neurônios.
Uma pesquisa realizada por pesquisadores brasileiros mostrou que desacoplar os neurônios pode ser uma estratégia simples e eficaz para a neuroproteção – isto é, interromper processos de morte celular relacionados a doenças neurodegenerativas como Parkinson, Alzheimer e epilepsia.
O estudo, publicado na revista PLoS One, foi liderado pelo professor Alexandre Kihara, coordenador da pós-graduação em Neurociência e Cognição da Universidade Federal do ABC (UFABC). O trabalho foi realizado com apoio da FAPESP por meio do Programa Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes.
Além de Kihara, participaram da pesquisa seus orientandos de doutorado Vera Paschon e Guilherme Higa – ambos bolsistas da FAPESP –, além dos professores Luiz Roberto Britto, do Departamento de Fisiologia e Biofísica do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP), e Rodrigo Resende, do Departamento de Bioquímica e Imunologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Segundo Kihara, embora sejam historicamente menos estudadas que as sinapses químicas, sabe-se hoje que as sinapses elétricas são fundamentais em diversas funções fisiológicas e cognitivas, como desenvolvimento, aprendizado, memória e percepção. Estudos recentes têm mostrado, também, que a participação das junções comunicantes no acoplamento entre os neurônios está relacionada com o espalhamento da apoptose, ou morte celular.
“Na apoptose, que é um processo comum a todas as doenças neurodegenerativas, o neurônio altera sua programação interna para ‘se suicidar’. Ocorre que, se um neurônio em apoptose estiver acoplado com um neurônio sadio – como mostra nosso estudo –, esse acoplamento permite a passagem de determinadas moléculas que aumentam a probabilidade de o neurônio sadio entrar em apoptose também”, disse Kihara à Agência FAPESP.
Segundo Kihara, no entanto, os cientistas ainda estão investigando quais são as moléculas envolvidas no espalhamento da apoptose por meio do acoplamento entre os neurônios. Além de tradicionais segundos mensageiros – como IP3, um importante sinalizador de cálcio – , o grupo da UFABC levanta a hipótese de que os microRNAs (miRNAs) podem estar envolvidos no processo.
“Os miRNAs regulam negativamente a tradução e representam uma camada adicional de controle entre o RNAm e as proteínas. A proposta de que miRNAs possam trafegar por junções comunicantes é considerada muito ousada. No entanto, ninguém conseguiu levantar argumentos concretos contra a hipótese, enquanto nós já temos alguns indícios a favor”, disse Kihara.
Para que ocorra um trânsito de moléculas entre as células, não basta que elas estejam acopladas. É preciso também que existam gradientes – isto é, que um dos neurônios acoplados tenha uma concentração de moléculas maior que o outro. Sendo assim, os pesquisadores usaram a estratégia de gerar gradientes a partir de lesões feitas com agulhas finíssimas nas retinas de galos.
A lesão era focada o suficiente para produzir a morte celular em um ponto específico do tecido, sem afetar o entorno, gerando um gradiente. Esse acoplamento foi manipulado farmacologicamente com diversas drogas. Quando os fármacos desacoplavam os neurônios, os pesquisadores observaram uma redução do espalhamento da morte celular.
“A estratégia foi produzir uma lesão aguda e localizada, com o intuito de gerar gradientes de concentração no tecido, para em seguida desacoplar bioquimicamente os neurônios. Para isso, uma dupla abordagem foi realizada, combinando lesões de retina in vivo e explantes de retina, modelo in vitro, mais adequado que as tradicionais culturas de células”, explicou Kihara.
Aplicação potencial
A estratégia de neuroproteção utilizando diferentes moléculas que desacoplam neurônios foi também capaz de regular negativamente genes pró-apoptóticos como as caspases. “A estratégia se mostrou tão eficiente que foi reproduzida in vivo, resultando em diminuição da área afetada e da morte neuronal”, disse Kihara.
“Mostramos também que os neurônios que estão em apoptose mantêm a expressão de conexinas – que são proteínas responsáveis por formar os canais de junções comunicantes, permitindo a ocorrência do acoplamento. Isso é importante, porque assim pudemos eliminar a hipótese de que um neurônio em processo de apoptose pudesse deixar de expressar as proteínas que formam o canal de acoplamento”, disse.
Segundo Kihara, a partir de agora os estudos irão investigar a hipótese de que os miRNAs transitem pelos canais de junções comunicantes e participam do processo de espalhamento da apoptose entre células acopladas.
A equipe que trabalhará com essa hipótese terá a participação de Erica de Sousa, aluna de graduação da UFABC e autora de um capítulo sobre miRNAs no livro Sinalização de Cálcio: Bioquímica e Fisiologia Celulares, que será lançado no início de outubro, no 1º Simpósio Brasileiro de Sinalização de Cálcio: Bioquímica e Fisiologia Celulares, na UFMG.
De acordo com Kihara, os estudos continuarão também a explorar as possibilidades de utilizar o desacoplamento de neurônios como estratégia de neuroproteção, com potencial aplicação no tratamento de doenças neurodegenerativas.
“Continuaremos investigando como e quando fazer isso de forma mais eficiente dependendo da doença. Mas acreditamos que uma nova porta foi aberta para estudos em neurodegeneração”, disse.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Grupo do ITA consegue destaque internacional com pesquisas sobre semicondutores magnéticos


Por Fábio de Castro
Agência FAPESP – Um grupo de cientistas do Instituto de Tecnologia da Aeronáutica (ITA) tem conquistado destaque internacional por obter avanços científicos na área de materiais semicondutores magnéticos, que poderão integrar os processadores e as memórias de computadores no futuro.
O professor Ronaldo Rodrigues Pelá, do Departamento de Física do ITA, recebeu o Prêmio de Melhor Artigo de Jovem Cientista, durante a Conferência Internacional de Física de Semicondutores realizada entre 29 de julho e 3 de agosto, na Eidgenössische Technische Hochschule Zürich (ETH), em Zurique, na Suíça. Receberam a premiação 15 participantes que haviam defendido doutorado há menos de um ano e que apresentaram, na qualidade de primeiro autor, um trabalho de elevado impacto na área de semicondutores. Uma comissão formada por pesquisadores de todo o mundo selecionou os trabalhos. O congresso teve mais de 800 participantes.
Desenvolvido como parte de seu doutorado no ITA, o trabalho apresentado por Pelá, que foi publicado na edição de maio da revista Applied Physics Letters, discute um método inovador para a simulação precisa e eficiente de materiais semicondutores magnéticos. Além de Pelá, o artigo teve participação de mais dois professores do ITA – Lara Kühl Teles, da Divisão de Ciências Fundamentais do Departamento de Física , e Marcelo Marques, da Divisão de Engenharia Eletrônica –, além de Jurgen Furthmüller, da Universidade Friedrich-Schiller, de Jena (Alemanha).
Pelá, Teles e Marques integram o Grupo de Materiais Semicondutores e Nanotecnologia(GMSN) do ITA, que foi formado a partir do projeto Estudo teórico de ligas semicondutoras com aplicações em spintrônica e optoeletrônica, coordenado por Teles e financiado pela FAPESP na modalidade Apoio a Jovens Pesquisadores, entre 2007 e 2012. A viagem de Pelá para o congresso em Zurique foi financiada pela FAPESP na modalidade Auxílio Reunião Exterior – Regular. Pelá também teve bolsas da FAPESP para realizar a iniciação científica e o doutorado direto no ITA, sempre sob orientação de Teles. Furthmüller veio ao Brasil em 2011 como pesquisador visitante do ITA, com apoio da FAPESP na modalidade Auxílio Visitante – Exterior .
Segundo Teles, o GMSN desenvolve cálculos de primeiros princípios em materiais semicondutores, ligas semicondutoras, poços quânticos, pontos quânticos, fios quânticos, nanofios, interfaces, impurezas, grafeno e semicondutores magnéticos. “O projeto Jovem Pesquisador da FAPESP foi muito bem-sucedido em seu objetivo principal que era o de nuclear um grupo de pesquisas sobre esses temas. A ideia era ter um grupo forte, oferecendo oportunidade para jovens pesquisadores iniciarem novas linhas de pesquisa em centros emergentes, quando elas não existem em sua instituição”, disse Teles à Agência FAPESP.
O GMSN, segundo Teles, conta atualmente com os três professores, um pós-doutor, quatro estudantes de doutorado, um estudante de mestrado e três de iniciação científica. A produção científica do grupo já se destacava em 2007, quando Pelá foi premiado durante a 1ª Conferência Internacional de Materiais e Tecnologias Spintrônicas, na Inglaterra, com um trabalho desenvolvido em sua iniciação científica.
Com foco em semicondutores e nanotecnologia, o grupo, segundo Teles, tem uma forte atuação na pesquisa sobre os materiais semicondutores compostos e simples, mas também sobre as ligas formadas a partir desses materiais.
“Fazemos simulações teóricas desses materiais para obter determinadas propriedades eletrônicas, estruturais, termodinâmicas e, eventualmente, magnéticas, já que existe uma classe de semicondutores magnéticos”, disse Teles.
Além de fazer as simulações de materiais, procurar prever suas propriedades e explicar observações experimentais, o grupo também tem uma linha de desenvolvimento de metodologias para a obtenção de propriedades especiais – como as propriedades relacionadas a estados excitados, por exemplo. “Essa é uma linha de pesquisa muito importante que foi incluída recentemente”, afirmou Teles.
Em 2008, o grupo publicou artigos na Physical Review sobre o desenvolvimento de uma nova metodologia para obter os chamados “gaps de semicondutores” – que são consideradas umas das principais propriedades desses materiais.
O trabalho foi desenvolvido em parceria com Luiz Guimarães Ferreira, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo. Em geral, segundo Teles, as metodologias para obtenção dos gaps têm alto custo – pois é necessário realizar os cálculos em clusters de computadores extremamente sofisticados – ou envolvem muitos parâmetros empíricos.
“Com uma metodologia que tem baixo custo computacional e operacional, desprovida de parâmetros empíricos, conseguimos um gap que é compatível com o valor experimental. Isso é um grande avanço e esperamos que dentro de alguns anos venhamos a ter um grande reconhecimento por esse trabalho”, disse Teles.
O desenvolvimento dessa metodologia, segundo Teles, foi uma das linhas de pesquisa mais importante desenvolvidas pelo GMSN ultimamente. O trabalho premiado de Pelá, segundo ela, é uma aplicação da mesma metodologia para materiais semicondutores magnéticos.
Outra linha de pesquisa importante, na avaliação de Teles, é a que estuda propriedades físicas de interface de semicondutores, heteroestruturas de semicondutores e nanocompostos – como o grafeno –, fios quânticos e pontos quânticos. “Essa é uma linha ligada a nanotecnologia, isto é, materiais de baixa dimensionalidade.
O grupo tem ainda uma terceira linha de pesquisa ligada a spintrônica – um campo multidisciplinar cujo tema central consiste na manipulação do grau de liberdade do spin – uma propriedade puramente quântica relacionada com o movimento angular intrínseco do elétron. “Os materiais semicondutores magnéticos entram na linha de spintrônica. Nessa linha fazemos simulações de dispositivos e estudamos as propriedades desses materiais”, explicou Teles.
Várias outras publicações foram feitas desde 2008, segundo Teles. Entre os mais importantes, além do trabalho premiado de Pelá, está um trabalho publicado pelo grupo na Applied Physics Letters, em 2011, que descrevia a aplicação da metodologia para estudos relacionados a ligas.
O grupo publicou ainda uma série de artigos sobre simulação de dispositivos spintrônicos nas revistas Journals of Supercondutivity e Novel Magnetism. Vários outros artigos foram veiculados em periódicos como Physical Review B eJournal of Applied Physics.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Produção literária brasileira no século 19 circulava pelo mundo


Por Elton Alisson
Agência FAPESP – Já no início do século 19 um leitor no Rio de Janeiro podia encomendar um livro recém-lançado em Paris, na França, e recebê-lo em 28 dias, que era o tempo que a obra necessitava para ser transportada por navio até o Brasil e que equivale, aproximadamente, ao mesmo prazo que empresas de comércio eletrônico estrangeiras, como a norte-americana Amazon, levam para entregar uma obra hoje no país quando não encomendada pelo sistema de correio expresso. Na mesma época, obras de autores brasileiros, como Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), foram traduzidas para o francês, o italiano, o latim e o russo, a exemplo do que ocorre atualmente com os livros mais lidos no mundo, que são lançados quase que simultaneamente em diferentes idiomas. Como os exemplos demonstram, a globalização da cultura não é um processo que se iniciou no século 20, com o advento das tecnologias de informação e comunicação. Mas remonta ao início do século 16 – quando espanhóis e portugueses começaram a viajar pelo globo – e se intensificou no século 19, quando os livros e impressos começaram a circular pelo mundo, criando uma forma especial de conexão entre as pessoas em diferentes partes do planeta, tal como a internet faz hoje. De modo a estudar o fenômeno sob uma perspectiva transnacional, pesquisadores do Brasil, Portugal, França e Inglaterra iniciaram um Projeto Temático, com apoio da FAPESP, com o objetivo de conhecer melhor os impressos e as ideias que circulavam entre os quatro países entre 1789 a 1914. No período, que ficou conhecido como o “longo século 19”, houve uma notável ampliação do público leitor e mudanças tecnológicas, como a ampliação da rede ferroviária europeia e o desenvolvimento dos navios a vapor, que facilitaram a divulgação e a circulação dos impressos pelas diferentes partes do globo.

Nessa época, quando os países começaram a se definir como nações que queriam se separar uma das outras, ao mesmo tempo em que o processo de integração ganhava força, livros brasileiros foram traduzidos para o francês e publicados na forma de folhetim em jornais em Paris e obras de autores franceses também fizeram o percurso inverso. “A tradução de livros na forma de folhetim fazia com que pessoas, em diferentes lugares do mundo, ficassem conectadas, porque liam mais ou menos ao mesmo tempo a mesma história nos jornais”, disse Marcia Azevedo de Abreu, professora do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora do projeto, à Agência FAPESP“Um capítulo de um livro recém-publicado na França era mandado por navio e traduzido no Brasil. Às vezes, o autor adoecia, por exemplo, e a tradução não podia sair aqui”, contou a pesquisadora.
Neste período também foram lançados livros e manifestos por intelectuais brasileiros, que estudaram em universidades de Portugal e da França e se tornaram membros de importantes instituições acadêmicas estrangeiras, como o Instituto Histórico de Paris. Durante a permanência na França, por exemplo, os brasileiros conheceram e estabeleceram relações com os intelectuais nativos, que lhes ajudaram a lançar publicações como a revista NiteróiNa revista, que circulou primeiramente em Paris e que para ser lida no Brasil era preciso importá-la, foi publicado pelo poeta brasileiro Gonçalves de Magalhães (1811-1882) o primeiro Manifesto Romântico Brasileiro.
Já a primeira tradução para o francês de O Guarani, de José de Alencar (1829-1877), foi publicada também em folhetim no século 19, sob o título Les filles du Soleil (As filhas do Sol), em um jornal lançado na França por um grupo de brasileiros para divulgar o Brasil no país europeu. “Algumas obras de grandes autores brasileiros também foram impressas primeiramente na França por Louis Auguste Garnier, que foi o maior editor brasileiro do século 19, porque era mais caro importar papel branco do que impresso no Brasil nesta época”, disse Abreu. “Além disso, era mais chique para os leitores brasileiros comprar um livro impresso na França, e as próprias editoras exploravam isso na publicidade, destacando que a obra havia acabado de chegar de Paris ou escrevendo na primeira página da obra que ela foi impressa na França”, destacou a pesquisadora. Por outro lado, de acordo com Abreu, assim que terminou a proibição de se imprimir publicações no Brasil, que vigorou até 1808, alguns livreiros, como o francês Paul Martin, começaram a publicar livros no Brasil e exportá-los para Portugal, onde Martin estava instalado, e que desempenhou um importante papel no processo de integração literária entre os países por meio das traduções. 

Como a grande referência no século 19, a França traduzia na época obras de todo o planeta para o francês, que era a língua que o mundo inteiro lia e partir da qual os países faziam as traduções para seus idiomas oficiais. Ao perceber que uma determinada obra lançada na França fez sucesso, os portugueses logo tratavam de traduzi-la para a língua portuguesa e a enviavam para o Brasil, possibilitando que não só as elites, que liam francês, pudessem ter acesso à obra. “O Brasil era a filial de muitos livreiros de Portugal, que eram muito ativos e traduziam muito rapidamente livros e impressos e enviavam para cá”, disse Abreu. “Mas não eram só os brasileiros que esperavam o que os estrangeiros mandavam para cá. Os estrangeiros também esperavam o que o Brasil mandava para o exterior”, ressaltou a pesquisadora.
Falso atraso e dependência cultural
Na avaliação da pesquisadora, as constatações feitas no primeiro ano do projeto de pesquisa contrariam o paradigma de que o Brasil esteve sempre atrasado culturalmente em relação aos outros países, e mais recebeu do que exerceu influência cultural. “A gente aprende que a França influencia culturalmente Portugal, que por sua vez influencia o Brasil, e que a influência cultural se esgota aqui. Mas temos observado que também há livros e impressos que saíram do Brasil e foram para estes países e que as trocas entre eles eram desiguais, mas recíprocas”, disse Abreu. A primeira história da literatura brasileira, por exemplo, foi escrita pelo francês Ferdinand Denis (1798-1890), que publicou em 1826 um livro na França intitulado O resumo da história literária do BrasilJá um romance de Victor Hugo (1802-1885) foi publicado no Brasil, antes mesmo de ser lançado na França, graças a um contrato de exclusividade com o editor do autor francês, conforme uma notícia publicada no Jornal do Commercio no Brasil na época, alardeando que o mundo inteiro deveria estar com ciúmes do país pelo feito. “Nós vimos que essas conexões entre o Brasil e outros países já existiam muito antes e que não havia a ideia de atraso, de dependência e de influência cultural, que não estão bem colocadas”, disse Abreu.
“Não que o Brasil fosse o centro do universo no século 19. Mas não era tão ruim como estamos acostumados a pensar, e o país estava sincronizado com outros no tempo, do ponto de vista da leitura”, afirmou a pesquisadora. De acordo com Abreu, um dos fatores que contribuem para essa falsa percepção do atraso cultural do Brasil em relação ao mundo é que se costuma pensar que economia e cultura são indissociáveis. Como o país não era economicamente desenvolvido no século 19, se pressupunha que sua cultura também era atrasada e fortemente dependente e influenciada por outros países. “Uma das conclusões preliminares importantes deste projeto de pesquisa é que a economia e a cultura não são tão casadas assim. No mesmo país em que havia escravos e era economicamente dependente, circulavam livros que eram lidos ao mesmo tempo aqui e em Paris”, disse Abreu.
Continuidade da pesquisa
Os pesquisadores estão buscando identificar quais os editores que atuavam transnacionalmente e quantos e quais autores brasileiros tiveram obras traduzidas no século 19. A pesquisa está sendo realizada em bibliotecas, além de em arquivos dos editores, comerciais e de polícia do Brasil e dos três outros países participantes do projeto, em que é possível analisar, por exemplo, os contratos comerciais de livreiros realizados com brasileiros e quais editores se instalaram no país. De acordo com Abreu, o projeto deve ganhar maior impulso agora, após a realização da Escola São Paulo de Estudos Avançados sobre a Globalização da Cultura no século 19, que ocorreu no final de agosto no IEL e Universidade de São Paulo (USP), com apoio da FAPESP. O evento reuniu professores e estudantes de pós-graduação de diversos países, que poderão se integrar no projeto. “Nós estamos em fase de prospecção e estabelecimento de parcerias com pesquisadores da França, Portugal e Inglaterra, sendo que alguns já se conheciam e trabalharam juntos e outros não. E a Escola possibilitou trazer todos esses pesquisadores para passar uma semana juntos e ouvir as sugestões dos alunos, para afinar as referências”, disse Abreu. 

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Reator trata efluentes e metais pesados num único processo


Uma indústria que trabalhe com metais pesados, como o cobre e cádmio, poderá se utilizar de um único reator para tratar de forma conjunta estes metais e o esgoto doméstico. A inovação vem sendo estudada na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP. “Estes metais são geralmente utilizados em indústrias metal-mecânicas e de galvanoplastia, e também é encontrado em águas de mineração”, conta o engenheiro Gustavo Mockaitis.
No Laboratório de Processos Biológicos da EESC, o cientista desenvolveu um protótipo, em escala laboratorial, de um Reator de Leito Ordenado que possibilita o tratamento simultâneo dos dois tipos de materiais.
Segundo Mockaitis, a ideia inicial era estudar um processo biológico que tivesse influência na recuperação de metais pesados, principalmente o cádmio e o cobre. “De início pensamos no tratamento dos efluentes de mineração, as chamadas águas residuárias de drenagem ácida. Trata-se de um líquido que não possui matéria orgânica”, descreve o engenheiro. No entanto, nas diversas águas residuárias que possam conter estes metais, as quantidades são muito variáveis.

Desenho do esquema do biorreator: o efluente entra pela parte inferior e sai pela parte superior do equipamento

Foi aí que o pesquisador optou por utilizar um efluente mais constante, ou seja, com as mesmas concentrações de materiais, principalmente orgânicos. “Passamos a usar o esgoto doméstico sintético onde foram adicionadas, gradativamente, concentrações de cádmio e cobre até onde o reator pudesse tratar o esgoto”, conta Mockaitis. Esta operação realizada em reator convencional de leito fluidificado significa um alto consumo de energia. “Foi aí que desenvolvemos o protótipo de um Reator de Leito Ordenado, mais econômico em termos de consumo de energia. Ele tem algumas configurações semelhantes a reatores convencionais, mas pode ser mais econômico”, explica. Assim, o protótipo, com capacidade para 4,5 litros, mostrou-se capaz de tratar, de forma conjunta, o esgoto doméstico e os metais (cádmio e cobre). Segundo o engenheiro, um reator em escala piloto teria capacidade de cerca de 6 metros cúbicos (m3).
O equipamento desenvolvido no laboratório é um cilindro vertical de cerca de 1 metro (m) de altura por 10 centímetros (cm) de diâmetro. A biomassa fica aderida em um meio suporte de espuma de poliuretano, dispostas ordenadamente dentro do biorreator. Por ser uma estrutura ordenada, tem muitos espaços vazios e não retém o material sólido do efluente. “O esgoto, acrescido dos metais, entra na parte inferior do reator que possui aparas de espumas fixadas internamente. As bactérias aderem a espuma e consomem tanto a matéria orgânica como o sulfato presente no efluente”, explica Mockaitis. Deste processo, resultará o sulfeto de cobre ou de cádmio, que permanecerá no reator em forma de lama. “Este material pode ser recuperado. Porém, novos estudos devem ser feitos para este fim”, avisa o engenheiro.
Depois do tratamento, o líquido que sai pela parte superior do reator possui carga orgânica baixa e que não chega a ser prejudicial ao meio ambiente, dependendo da extensão da contaminação por metais pesados na água a ser tratada. “O ideal é que após este processo, o líquido seja submetido a outro tratamento em um reator aeróbio”, aconselha. A pesquisa, que consistiu no projeto de doutorado de Mockaitis, foi iniciada em março de 2008 e concluída em abril de 2011, sob orientação do professor Marcelo Zaiat, da EESC.